Henkels, o pão de lágrimas

  • por Persephone (BNU/FLN)

  • Máscara Inteira.
  • Técnica: Papietagem em papel Paraná (reciclado) e cola PVA, massa corrida, tinta Chalk, verniz, aplicação de cabelo da artista

Na cozinha de sua casa, Henkels sabe o exato local onde guardou absolutamente todos os potes, formas, facas, colheres de pau, as compotas, as geleias, as cucas etc. Nunca foi adepta de protetor solar, até porque… não existia na sua vida até recentemente o autocuidado. A infância foi plantando e colhendo aipim na terra roçada, no seio familiar.

Nasceu, cresceu e até hoje habita no mesmo terreno, ao lado de um ribeirão que já foi límpido, canalizaram e agora é aterrado, escondido dos olhares e narizes. Este terreno pertenceu a seu pai, assim como a vida dela, a filha, antes do casamento. Um corpo-território apropriado.

Casou jovem, grávida da primeira de sete, noiva com vestido amarelo, não branco, obviamente que não por escolha dela. Símbolo-paradoxo de um tabu explícito. Esse amarelo, o retrato emoldurado, em preto e branco (sépia, na verdade), nunca deixou visível. Melhor assim… melhor assim…

A ingratidão pelo seu trabalho já muito perfurou seu peito, como se fosse uma faca de serra. De seus olhos já verteram lágrimas, que caíram dentro das massas de pão de todo dia.

Acompanhou a saída de casa e construção da vida de cada um da penca de sete filhes. O caçula é trans, uma da netaiada também. Nunca se atreveu a falar muito sobre isso. Melhor assim…melhor assim… Ainda engole desaforos. Melhor assim… melhor assim… Não vota mais. Melhor assim… melhor assim… Quase tudo que sei sobre sua história, ela não quis me contar. (suspiro) Melhor assim… melhor assim…

Essa máscara é uma homenagem a minha avó paterna, também inspirada na personagem Olga, do livro Paraízo-Paraguay, de Marcelo Labes. Se fôssemos matriarcais, Henkels poderia ser um dos meus sobrenomes.